Mapeamento de cartórios começou em agosto. Dos
10 primeiros que foram investigados, um revelou que não recebia visita
fiscalizatória desde 1982.
A corregedoria do Tribunal de Justiça de São Paulo iniciou uma
investigação inédita nos cartórios da capital paulista. Dos 10 avaliados até
agora, em três foram constatados problemas relacionados ao repasse, três estão
sob suspeita e quatro estão aparentemente regulares, revelou a juíza Paula
Gomes, da equipe de assessores que fez a investigação. A corregedoria já
realizava fiscalizações, mas, segundo a juíza, “o ineditismo é o foco na parte
de repasses e recolhimentos”. O setor movimenta grandes cifras. Em 2016, os
cartórios do estado arrecadaram R$ 5,3 bilhões. Outra novidade apontada pela
magistrada é a fiscalização feita independente da corregedoria ter recebido
alguma denúncia ou não. No interior do estado, são obrigatórias fiscalizações
anuais. Já na capital não existe essa obrigatorieadade, e as visitas eram
feitas normalmente após o recebimento denúncias. Um dos cartórios revelou que
não recebia uma visita fiscalizatória desde 1982. O objetivo da corregedoria é
investigar os 124 cartórios da cidade. A apuração surgiu a partir de situações
constatadas no interior do estado. Em Santos, no litoral paulista, apenas um
cartório desviou R$60 milhões. O mapeamento dos cartórios na capital começou em
agosto. Os critérios de escolha para os 10 primeiros foram, principalmente, a
arrecadação e o balanço anual. “Verificamos despesas que saltavam aos olhos e
que se diferenciavam de outras do mesmo porte“, disse a juíza. “Por exemplo, um
gasto com locação de mobiliário que era dez vezes superior aos outros da
capital”. As fiscalizações in loco foram feitas em setembro e outubro. As
visitas eram formadas por dois juízes e três funcionários do Tribunal de
Justiça. Os 10 cartórios investigados vão “de Cambuci a Pinheiros”, disse a
juíza. A previsão é que os endereços sejam revelados no dia 30 de novembro,
quando será apresentado no Tribunal de Justiça o resultado da investigação dos
10 cartórios. Os principais problemas foram relacionados aos repasses. Dos
serviços prestados pelo cartório, uma parte fica com o local e outra tem que
ser repassada para órgãos credores – o que verificou-se muitas vezes não era
repassado. Para cada serviço feito pelos cartórios há uma guia de repasse e
essas guias precisam ser verificadas manualmente, o que dificulta a
fiscalização, segundo a juíza. “Estamos trabalhando para a criação de
mecanismos mais modernos”. Após a leitura do resultado das investigações, se
constatadas as irregularidades, será decidido qual medida tomar. “Vamos
apresentar todos os dados e problemas e dar as determinações que temos que dar
no âmbito administrativo, que é nosso âmbito de atuação”, explicou Paula Gomes.
A sanção mais dura é a chamada “perda de delegação” pelo dono do cartório, que
perde o cargo. O local pode também passar por multas e outras penas previstas
na lei. Em nota, as entidades representativas dos notários e registradores do estado
afirmaram que manifestam seu compromisso público de apoio às investigações. “Em
auxílio à fiscalização, a Associação dos Notários e Registradores do Estado de
São Paulo (ANOREG/SP) e o Sindicato dos Notários e Registradores do Estado de
São Paulo (SINOREG/SP) estão desenvolvendo um sistema de controle automático de
recolhimento de tributos e repasses a órgãos públicos, cujo montante equivale a
38,49% do total dos valores arrecadados pelos cartórios e que são destinados a
seis entidades previstas em diferentes Leis Estaduais. Este sistema deverá
iniciar sua operação até o final deste mês de novembro. As entidades reiteram o
compromisso de notários e registradores em conferir segurança, autenticidade,
publicidade e fé pública aos atos pessoais e patrimoniais de toda população
paulista, para que a relação entre Cartórios e sociedade permaneça ancorada na
fé pública que sempre baseou o nosso serviço”, diz o texto
Cartórios de SP desviam mais de R$ 100 milhões dos cofres públicos Uma
investigação da Corregedoria do Tribunal de Justiça de São Paulo em 33
cartórios já identificou desvios de mais de 100 milhões de reais dos cofres
públicos. Entre as irregularidades estão a sonegação de impostos e fraudes nos
repasses obrigatórios ao estado e às santas casas. A investigação foi feita em
uma pequena amostra dos cartórios do estado. De 1.515 unidades, 33 foram
fiscalizadas. Em nove foram encontradas irregularidades que terminaram com a
destituição do titular do cartório. A soma dos desvios em seis desses nove cartórios
é de pelo menos R$ 107 milhões. Em três unidades a conta ainda está sendo
feita. De tudo que é arrecadado nos cartórios, 38,5% tem que ser repassado ao
estado. Esse montante vai para os orçamentos do Tesouro estadual, do Tribunal
de Justiça, do Ministério Público, da Defensoria Publica e das Santas Casas de
Misericórdia, que vivem grave crise financeira. As irregularidades aconteceram
nesses repasses. O juiz Manoel Calças, corregedor-geral do TJ, lembra que os
cartórios são muito rentáveis aos seus donos, o que torna os desvios
surpreendentes. “O que nos causa espécie é que são tabelionatos altamente
rentáveis, em que esses tabeliães, portanto, recebem mensalmente uma renda
fabulosa, e ainda tem o desplante – a palavra é essa – de promover uma sonegação
em níveis estratosféricos.” O caso mais grave aconteceu no 2º Cartório de
Registro de Imóveis de Santos, que deixou de repassar R$ 31 milhões ao estado.
Em valores corrigidos, o rombo chega hoje a R$ 94 milhões. Ainda em Santos, o
6º Tabelião de Notas deixou de repassar mais de R$ 3 milhões ao estado. Na
capital, o cartório de Registro Civil da Casa Verde diminuiu artificialmente a
receita e aumentou as despesas, gerando uma renda líquida inferior à real. O
desvio chegou a R$ 800 mil em quatro anos. O titular do 5º Tabelião de Notas da
capital, na Chácara Santo Antônio, desviou quase R$ 8 milhões No cartório de
Registro Civil de Perdizes o problema foi sonegação. O titular deixou de
recolher R$ 1 milhão ao FGTS e ao INSS, em valores não corrigidos. O mesmo aconteceu
no Tabelião de Notas e de Protesto de Promissão, no interior, que deixou de
pagar R$ 400 mil em impostos. Em outros dois cartórios do interior a conta dos
desvios ainda não foi concluída. O corregedor-geral do TJ diz que os envolvidos
também devem ser alvo de ação penal. “Nós poderíamos ter eventualmente
concussão, peculato, qualquer uma das hipóteses que pode ser caracterizada, ou
crime de apropriação indébita mesmo, ou crime de sonegação fiscal. Vai depender
do enquadramento que o Ministério Público, que é o titular da ação penal,
entender que é mais adequado para a oferta de uma denúncia perante a Justiça
pública.” Essa é a maior investigação já feita nos cartórios. Em 2016, os
cartórios do estado faturaram R$ 3,6 bilhões de reais. A Anoreg, Associação dos
Notários e Registradores do estado, informou que está à disposição da Justiça
para auxiliar na investigação. A entidade que representa os cartórios diz que,
para combater as fraudes, vai implantar um controle automático de recolhimento
de tributos e repasses a órgãos públicos.
NOVEMBRO/2017